quinta-feira, 22 de novembro de 2012

5 MILHÕES DE CESTINHAS (F.F.)



Era dia das bruxas - embora não parecesse. O dia estava gelado, no meu trabalho o ar condicionado estava muito forte. A manga comprida do meu uniforme nunca me foi mais útil. Eu trabalhava em um supermercado bastante visitado. O meu serviço era recolher as cestas de compras que os clientes deixam nos caixas. Já estava perto da hora de eu ir embora. Eu queria ir para casa assistir um programa na Discovery Channel sobre vida na selva. Meu chefe pediu para que eu recolhesse todas as cestas e depois estaria liberado. Fui todo alegre disposto a fazer minha última tarefa do dia. Foi nesse momento que me deparei com uma coisa: haviam cinco milhões de cestinhas.

No ônibus, a caminho de casa, um homem na minha frente estava lendo um jornal. Eu estava entediado, tinha esquecido o mp4 em casa - nem isso para me distrair. Na página de TV havia uma reportagem sobre o programa que eu iria assistir mais tarde, e com isso minha volta para o lar foi mais divertida e interessante. O dono do jornal virou a página antes que eu terminasse de ler a matéria, e parou na parte sobre Ações Filantrópicas. Falava sobre uma grande arredação de dinheiro feita por parte de atletas e que iriam ser doadas para instituições de caridades: Jogadores de futebol deram 2 milhões, os de vôlei deram 3 milhões e o lance mais alto foi dos melhores jogadores de basquete - 5 milhões, de cestinhas.

Cheguei em casa, tomei um banho, esquentei um pedaço de lasanha, e deitei na rede para esperar o programa. Ainda eram 19h, e o programa começava as 21h. 2 horas para me distrair. Encontrei um programa sobre escavações e povos antigos. Fiquei assistindo. No capítulo daquele dia contava a história de uma tribo que vivia no meio da Guatemala há muito tempo atrás. O apresentador do programa usava um capacete com uma lanterna embutida, com o qual ele conseguia enxergar ao entrar nas cavernas escuras daquele local. Nas paredes haviam umas inscrições estranhas, mas letras parecidas com o alfabeto usado atualmente. Só que as palavras não faziam sentido algum. Estava escrito: sah nits eced seoh lim oc nic.

21h. Meu programa começou. Billie Harding era o homem perdido na selva. Ele ficou sozinho na mata durante 2 meses e meio, sem suprimentos. Ele levou uma câmera com a qual filmou momentos incríveis. Aves, peixes, ursos, onças, lobos, javalis e todo tipo de animal foram registrados em vídeo. Ele contou como conseguiu sobreviver aos perigos, se proteger da imprevisibilidade do clima, e ainda sim, manter a sanidade - considerando a solidão que passava e a necessidade de interação com outros seres humanos, o que não tinha. O repórter perguntou como ele conseguiu comida: ele disse que se alimentava de animais. E ele conseguiu matar leões e que os guardava em vasilhas e cestinhas. O repórter perguntou se ele comeu os leões guardados em cestinhas. Ele respondeu: Sim, comi leões de cestinhas.


Frederico Formiga

6 comentários:

  1. Olá, Frederico!

    Bom, depois de ler seu texto, fiquei intrigada. Será que ele reflete imagens esparsas de um dia da sua vida? Ou será que reflete (com alguma dose de loucura) eventos que efetivamente aconteceram a alguém, e que, contados desse modo, assumem a forma de crônica acelerada do dia a dia? E o título? Nossa, você sempre subverte meus conhecimentos acumulados nas aulas de redação! rsrs

    Bom texto!
    Abraços!

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    1. Susanna,

      desculpe-me a intromissão, mas identifiquei-me com seu comentário. Especialmente na parte: "Nossa, você sempre subverte meus conhecimentos acumulados nas aulas de redação!" Adorei ler essa frase! Senti o blog pulsando... Eu odiava ler; e há 5 anos atrás, julgaria insano quem me dissesse que eu tinha condições de escrever um bom texto. Ainda não escrevi nada bom, mas sei que um dia chegarei lá. Enfim, perdi o medo de escrever. Esse medo derivava dos "conhecimentos" transmitidos nas aulas de redação. TODOS os meus textos começam pelo título, o que é (ou pelo menos era. Não sei agora) totalmente abominado em qualquer sala de aula. Espero que os leitores desse blog notem que a escrita também é uma forma de arte, uma forma de expressão, e por isso, NÃO EXISTE "O ERRADO" ou "O CERTO". Obviamente, algumas técnicas são válidas e é sempre bom ter alguém (com mais experiência - um professor talvez) para lhe ajudar. Mas o legal é escrever!

      Enfim, não fiquemos presos a regras! Vamos escrever!

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  2. Quando Almeida Garrett escreveu o livro 'Viagens na minha terra', no século XIX, ele retratava, biograficamente, uma viagem feita por ele de Lisboa e Santarém. Embora o livro narre uma história de ficção, depreende-se essa noção biográfica. Neste livro reinam digressões, que pouco respondem aos leitores o porquê de estarem presentes no livro. Não por acaso, 'Viagens na minha terra' foi o único livro de Garrett. Se lermos o prólogo da 2ª edição do livro, vamos notar que o tamanho do cigarro de maconha fumado por Almeida Garrett para escrever não só livro, mas também o próprio prólogo da 2ª edição, não media menos que 40 centímetros. Sendo interessante, baixem a versão digitalizada (em .pdf) no site Virtual Books On line e leiam o prólogo.
    Logo, "5 milhões de Cestinhas" é a hipótese materializada de uma digressão bem sucedida. Se você entrar num táxi e o motorista perguntar "para onde o sr. deseja ir?", interessante será responder "5 milhões de cestinhas". Se a srta. for ao salão de beleza e a profissional perguntar qual corte desejas: "5 milhões de Cestinhas" é a melhor resposta. Se no resultado do ENEM não constar "5 milhões de Cestinhas" alguma coisa saiu errado.
    A grande verdade é que é de uma contrastiva e hiptonizante metaforização do nada que se dá a "5 milhões de Cestinhas" um lugar extremamente jactancioso para os dias de hoje. Afinal, quem nunca se deparou (assombradamente) com "5 milhões de cestinhas"?

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  3. Adorei a brincadeira! Seu texto tem pontos que eu adoro ler, e as vezes utilizo em meus textos, como por exemplo as informações irrelevantes, que não acrescentam em nada ao texto, tipo: "A manga comprida do meu uniforme nunca me foi mais útil". Isso dá uma leveza ao texto e me aproxima dele enquanto leitor.
    Gosto da sonoridade do último parágrafo e da frase escrita ao contrário (que eu vira e mexe coloco em meus textos).

    Agora uma pergunta: 5 milhões de cestinhas é um tipo de maldição do dia das bruxas?

    Tentarei melhorar a pergunta: A estória se passa no dia das bruxas! Isso influencia nos acontecimentos do texto?

    Ótimo texto!
    Abraço

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  4. Gente, a ideia do texto é simplesmente escrever uma história em que, no final de cada parágrafo apareça a mesma frase só que com um novo significado...

    Por exemplo:
    1- Cinco Milhões (quantidade) de Cestinhas (cestos).
    2- Cinco Milhões (dinheiro) de Cestinhas (jogadores).
    3- "sah nits eced seoh lim oc nic" (ao contrário).
    4- Sim, comi leões de cestinhas.

    A ideia é simplesmente essa, mostrar que uma coisa dita pode ter várias interpretações. O texto funciona melhor quando alguém lê para você, sem saber como está escrito. E dando uma ênfase toda vez que chega no final dos parágrafos. O resto do texto é meio que encheção de linguiça, é um enfeite desses trocadilhos.

    Eu particularmente gosto de trocadilhos:
    - A sua perna da cãibra, a do Frederico formiga.

    Tipo isso. Hahahaha

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